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A pauta e o palhaço
A pauta e o palhaço

A pauta e o palhaço

Marcelo Cavalcante

 

Seguramente milhares e milhares de presos neste país se encontram em situação de saúde bem mais grave do que o mensaleiro José Genuíno e, nem por isso, a nossa justiça é célere em lhes conceder o benefício da prisão domiciliar. Em muitos casos, milhares já morreram encarcerados em função de tais circunstâncias e, apesar disso, a mídia não se abalou em noticiar e nem ministros do STF teceram suas abalizadas opiniões sobre estas mazelas do nosso sistema carcerário. Se esse país fosse sério e mantivesse o princípio basilar de igualdade de tratamento para todos, os condenados no processo do mensalão estariam felizes com as penas extremamente brandas e certamente ficariam caladinhos. Da mesma forma, ficariam satisfeitos com as condições carcerárias que recebem, pois sabem o que acontece de catastrófico nas penitenciárias pelo Brasil afora, adentro e ao centro. Eles devem ter conhecimento de que, pelo furto de uma galinha, muitos brasileiros foram espancados em delegacias, receberam sentenças acima de sete anos e ficaram jogados, que nem lixo, em depósitos de carne humana.

Entretanto, o que se vê nas reações dos mensaleiros, notadamente dos petistas, é um esbanjar de arrogância e questionamentos não contumazes à justiça. Esta postura é fruto da frustração pela certeza da impunidade que falhou e, desta forma, sentem-se traídos, pois sabem que milhares de seus pares deveriam ser punidos e não o foram nem serão. Junte-se a isso o delírio de uma elite que não se contenta com a impunidade e os privilégios, mas que se compraz diuturnamente em esfregar tais “condições olimpianas” na cara do populacho desprezível e otário.

Como reflexo deste Estado sem lei (entre os poderosos), eis que o advogado do ex-deputado do PT, hoje criminoso, José Genuíno, intempestivamente tomou a palavra no plenário do STF e exigiu que o seu presidente, Joaquim Barbosa, colocasse em votação, de imediato, o pedido para que o seu cliente cumprisse a sentença em regime domiciliar.

Sem entrar no mérito da questão de como o mensaleiro vai cumprir a sentença a que foi condenado, o fato de um advogado (a serviço do PT e possivelmente pago com o dinheiro do Fundo Partidário = dinheiro público) interromper um julgamento do STF (sobre o tamanho das bancadas de treze estados na Câmara de Deputados) para exigir que outro processo, não pautado, seja imediatamente julgado, é fato extremamente grave e não acredito que seja desculpável, apesar de que compete ao advogado usar de todos os meios para defender o seu cliente, conforme entendimento do ministro Marco Aurélio Mello. Evidentemente que todos os meios lícitos e consoantes a boa educação. Ao que tudo indica, não é lícito nem legal pautar na marra e por vontade própria, as causas a serem julgadas, uma vez que isto é prerrogativa da presidência do Supremo.

Podemos aqui discutir se esta prerrogativa da presidência é benfazeja ou não, podem os com competência institucional, mudar tal dispositivo, entretanto, é o procedimento legal em vigência que tem que ser respeitado.

Muito estranhamente o ministro Marco Aurélio Mello acredita que foi uma ação justificável, uma vez que era o único recurso que o advogado poderia usar naquela situação. Interesses político-partidários à parte, caso tal procedimento seja aceitável para o ministro Marco Aurélio, toda sessão do STF poderia ser naturalmente interrompida com um ou outro advogado bradando pelo julgamento imediato da ação na qual tem interesse. Com tantos processos emperrados, alguns com décadas, por que o do senhor Genuíno teria primazia? Não nos esqueçamos que a PEC do Calote (dos precatórios) foi julgada inconstitucional e até hoje, mais de ano decorrido, o Supremo não apresentou a tal modulação necessária e nem por isso advogados interromperam sessões exigindo o imediato julgamento.

Por seu turno, a valorosa OAB, por dever de ofício ou vontade de falar asneiras, entende que “A diretoria do Conselho Federal da OAB repudia de forma veemente a atitude do presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, que expulsou da tribuna do tribunal e pôs para fora da sessão mediante coação por segurança o advogado Luiz Fernando Pacheco, que apresentava uma questão de ordem, no limite da sua atuação profissional, nos termos da Lei 8.906. O advogado é inviolável no exercício da profissão”. Não há nada nesta lei que permita um advogado interromper uma sessão de um tribunal para requerer que a sua ação seja imediatamente incluída na pauta. Realmente, segundo a Lei 8.906, em seu Art. 2º § 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta lei. Muito certamente os próceres da OAB se esqueceram de observar que essa tal inviolabilidade se esgota “nos limites da lei”.

No dia de hoje, ficamos sabendo através de declarações na mídia que, segundo o ministro Marco Aurélio Mello e a OAB, todos os advogados podem legalmente interromper sessões nos tribunais do país para exigirem que suas ações sejam colocadas imediatamente nas pautas e celeremente julgadas. Fico imaginando se a moda pega e, por todos os rincões do país, os advogados passem a interromper as sessões de julgamentos (em todas as instâncias) brandindo exigência de igual teor, devidamente escudados na justificativa canhestra do ministro Marco Aurélio e na argumentação facciosa da OAB.

Isto tudo está a indicar que, quando se trata de briga entre as elites, não há lei nem limites e todo mundo fala o que deseja, da forma que quer, mesmo que ao arrepio das leis que, ao que tudo indica, são regras que sujeitam apenas este rebanho babento de povo babaquara.

Sabemos que a pauta é formada pelas ações que serão julgadas em determinado dia, resta-nos saber, nessa história, que é o palhaço.

 

Nota: Esta questão dos mensaleiros condenados tem o condão de mostrar que o Partido dos Trabalhadores mostra-se extremamente zeloso para com os seus caciques encarcerados ao passo que, enquanto um partido político, deveria estar preocupado com a situação geral das condições carcerárias do país, o que não acontece, ou seja, demonstra estar preocupado apenas com as questões que interessam ao partido e aos seus quadros.

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